quarta-feira, 11 de novembro de 2015

PRA ONDE SE OLHA, A GENTE SE MOSTRA.

Estava saindo do restaurante Hortelã, quando me deparei com um cidadão de paletó, na parte de cima da calçada, olhando pra um ‘flanelinha’ que estava no lado debaixo, no estacionamento. Um olhava pra baixo e falava num tom arrogante, o outro, olhava pra cima e respondia numa voz quase inaudível.
Foi aí, que pensei.

Q
uem se sente maior sempre olha para os outros como se fosse superior. Vive no pedestal. Alimenta-se na sua base. Percebe-se melhor do que os outros. Continuamente olha para baixo.

É isso, está sempre olhando para baixo.

Quem olha para baixo, usualmente rejeita as pessoas e exclui os já excluídos da sociedade, faz parte de uma elite falsa que se afasta do povo, ao invés de reuni-lo. Seu montante de bens o faz sentir-se poderoso e não busca da sabedoria do alto.

O humilde, ao contrário, conhecendo-se como um ser limitado e um servo inútil, busca as coisas do alto.

É isso, está sempre olhando para cima.

Este se percebe incompleto, finito e necessitado. Está permanentemente se reconhecendo pequeno e crendo que somente ELE é bom. Medita as palavras do evangelista Lucas: “Somos servos inúteis”.

Crendo que somente ELE é bom e nos preenche, O busca e quando mais se aproxima DELE se percebe o quão pequeno se é. É nesse caminho que se vai conquistando a paz interior, o bem pelos outros e o amor de Deus.

Aquele que se acha maior, melhor e mais merecedor, é autossuficiente e pouco aprende com o irmão, se afasta do Reino e se perde na sua mesquinhez.


Não se nega aqui que todos somos irmãos, filhos do mesmo Pai, mas nos adverte o livro da Sabedoria: “O pequeno pode ser perdoado por misericórdia, mas os poderosos serão examinados por poder”.



domingo, 18 de outubro de 2015

É MELHOR PEDIR DESCULPA QUE COM LICENÇA


É
 melhor pedir desculpas do que com licença.

É melhor uma Igreja que saia “em direção aos outros para chegar às periferias humanas”, mesmo que tenha possibilidade de sofrer imprevisto, que seja “ferida e enlameada por ter saído pelas estradas”, que peça desculpas por seus possíveis erros e enganos do que uma Igreja que fique dentro da sacristia acomodada, improdutiva e escondida detrás da indiferença. Pois seu pedido de licença, como nos diz José Comblin, não passa de uma falsa prudência humana, uma falsa prudência dos judeus contemporâneos de Jesus.

A Igreja somente tem possibilidade de pedir desculpa quando atua, erra e aprende, quando nessa caminhada serve ao Reino e busca a glória de Deus. É quando, ao povo de Deus, leva a Palavra, celebra a Eucaristia e vive a Caridade.

Do contrário, a Igreja que se esconde na sacristia é aquela que busca a glória de si mesma, que não corre em busca da dignidade do irmão. Que não caminha e não caminhando, não contempla o mistério da misericórdia. E quem não contempla a misericórdia desconhece a fonte da felicidade, da serenidade e da paz. E sem a paz, perde-se a força de dar passos no caminho que une Deus e o homem.

É isso aí.


A propósito, a Igreja somos nós!

quinta-feira, 3 de setembro de 2015

Efetividade, eficácia e afetividade

T
ermos que quando bem compreendidos são instrumentos de um bom relacionamento, os quais têm relações fundamentais e intimamente ligadas.
A gente pode até brincar com esses termos, mas eles interferem nos nossos relacionamentos pessoal, familiar e social.

Quando vou diariamente à 83, estou sendo efetivo, constante e fiel. E se preocupo com o funcionamento da casa, com a organização etc, passo a tomar uma posição de eficácia. Mas isso só não basta. Falta a afetividade, o sentimento e o carinho com as pessoas, a preocupação com seus problemas e suas tristezas. Uma atitude de amizade e bem querer.

O mesmo acontece com os casais que costumam passear nos shoppings e nas praças. Podem ter esse comportamento como programa semanal. Esse momento de diversão é prioridade deles. Isso tem uma enorme importância e é muito bom. Nesse caso, a afetividade é a qualidade do momento dos dois. Um beijo, um abraço, um gesto de carinho. Mostrar que está feliz com a companhia, que tudo aquilo lhe agrada.

Em relação aos netos. Dar presente no aniversário é efetividade. Comprar o presente que lhe agrada é eficácia. Isso tem uma enorme importância e é muito bom. Mas o melhor para eles é ficar com eles, é sentar no chão e... brincar de lego. É se entreter e se divertir com eles. Isso é afetividade.

Como se pode ver, o que está em questão aqui é a orientação para um relacionamento afetivo, alegre e carinhoso. Isso coloca a questão concreta da saída da coisa impessoal, indiferente e fria.

A afetividade tem um duplo efeito positivo sobre o relacionamento entre as pessoas. Diretamente, como já foi dito, reduzindo ou eliminando a apatia. Indiretamente, eleva o afeto, o prazer de estar junto, o gostar de dividir as tristezas e alegrias.

Antes de mais nada, trata-se de se desintoxicar do vício do “eu” – ou até mesmo do trabalho – elementos importantes do drama de muitos relacionamentos familiares e sociais.

Enfim, dos três termos, pode-se dizer que são todos igualmente importantes. Parece-me, contudo, que um deles tem um papel estratégico no relacionamento humano: a afetividade.


quinta-feira, 27 de agosto de 2015

Cem dias... um novo dia... um novo tempo!

E
stamos às vésperas dos cem dias sem a mamãe ou, digamos melhor, com a mamãe no outro lado.

Pensar nisso e nela implica numa reflexão.

Implica um tempo de reavaliação e de compromisso. É tempo de recordar e corrigir-se. Um tempo para retomar a caminhada. A caminhada por ela traçada e na qual seus pés pisaram, suas lágrimas derramaram e nela fincou seu coração.

Se tivermos força de assim pensar e por ser uma atitude tão sublime e bela poderíamos provocar uma grande celebração, na qual se tocaria a trombeta, se reuniria uma assembleia, proclamaríamos a Palavra de Deus e renovaríamos a vida.

Sejamos, entretanto, mais simples.

Façamos esse cem ser um dia pessoal e íntimo, um dia de grande oração de louvor e agradecimento, sobretudo, pelo dom da ressurreição. Façamos que esse dia exija de nós uma busca da vivência da justiça e da misericórdia de Deus e o perdão das dívidas, da reconciliação com os irmãos e da intensificação do compromisso de solidariedade com os pobres e excluídos.

Esse dia, assim como seu legado, é mais forte que nossas convicções, assim como o amor é mais forte que o ódio e a vida mais forte que o escuro de nossas fortalezas, pode ser um novo dia.


Um novo dia... um novo tempo!

segunda-feira, 24 de agosto de 2015

O outro, o irmão, o próximo.


“Em
 verdade vos digo que tudo o que ligardes na terra terá sido ligado nos céus, e tudo o que desligardes na terra será desligado nos céus”. Mateus.

A bíblia nos ensina que essas palavras do novo testamento se referem ao sacramento da reconciliação. Um encontro interpessoal que faz parte do sinal sacramental e manifesta a interioridade da pessoa, além da necessidade de um diálogo a sós entre o penitente e o ministro.

Quanto a isso não há discussão, entretanto, me atrevo a ir mais além.

As pessoas de bom senso sentem necessidade de pedir perdão e se dispor à conversão. Mas o que é a conversão? Supõe a ideia de quem tomou a decisão errada ao seguir um caminho, a necessidade posterior de abraçar o outro caminho.

E quando isso acontece ou deixa de acontecer?

Isso ocorre quando nós nos ligamos a Deus ou nos desligamos DELE.

Quando fazemos o bem ao outro, nas vezes que nos aproximamos com carinho do próximo, nas ocasiões que esquecemos os conflitos com o irmão e lhe estendemos a mão e abrimos nossos braços para um abraço: nesses momentos nós – eu e o irmão – estamos ligados a ELE. Reparem que ninguém se liga sozinho a Deus.

Infelizmente, nós também temos o poder de desligarmos do irmão e de Jesus. São quando nos deixamos levar pelo rancor, pelo orgulho e pela vaidade. São às vezes em que nossas fraquezas e a falta de humildade nos dominam e nos levam a atitudes orgulhosas, que não nos deixam pedir desculpas e negamos um ombro amigo e um colo carinhoso. Reparem que podemos se desligar sozinho de Deus.

São dois caminhos bem distintos, que todos nós sabemos perfeitamente distingui-los e que temos a liberdade de escolher. A opção é nossa assim como as consequências.

A preferência por um inviabiliza o outro. Mas nenhum é definitivo. Podemos cair, podemos reconhecer o erro, podemos voltar atrás. Mas somente um nos traz a alegria, a alegria do encontro. É quando nos interessamos pelo outro, quando queremos o bem do outro, quando nos ligamos ao outro, que nos liga a Deus.  A isso se dá o nome de amor.


E o amor é a melhor coisa que podemos fazer na vida e é a melhor coisa porque o amor nos liga ao irmão e a Deus.


terça-feira, 23 de junho de 2015

Porque somos irmãos...

P
orque ser irmão é assim: bate, leva, grita, chora, sorri, abraça, começa e recomeça.

Porque ser irmão é como ser um cacho de uva, parecem iguais sendo diferentes, lindos quando juntos, mas murcham quando separados.

Como uma xícara de café à tardinha, às vezes reconforta, às vezes tira o sono.

Como um pé de maracujá, começam iguais, de uma mesma flor, mas uns crescem e amadurecem primeiro, outros ficam mais tempo verdes, mas todos cheios de esperança.

Porque irmãos são assim: discutem, brigam, batem portão, mas retornam como se nada tivesse acontecido... e ninguém fala mais nisso.

Porque irmão fica sem almoço para dar um abraço de despedida, perdem jogo, transferem tarefas, mas se faz presente na partida.

Porque irmão fica magoado, fala mal, troca desaforo, estende a mão, reza, pede, faz picuinha, esquece, brinca, se diverte, diz que não volta, mas esquece e volta.

Porque ser irmão é aceitar o perdão que não se pede, é reconhecer que errou sem se sentir diminuído, é sentir igual, é viver igual... não é ser maior ou melhor... é apoiar e compreender.

Ser irmão é perpetuar no outro o amor que recebemos dos nossos pais.

Ser irmão, para mim, é isso... e isso é ótimo.

E ótimo que meus irmãos sejam vocês!


Ana Lúcia Lino

terça-feira, 26 de maio de 2015

Amou-nos sempre!

E
stou aqui sem ter previamente tratado dessa reflexão com os filhos da mamãe, mas me atrevo a falar em nome deles. Venho, em nome de todos eles, porque o momento é de vangloriar.

Sim! Nos vangloriamos! Não simplesmente pelos 105 anos, um tempo memorável, mas e, principalmente, como ela viveu esses anos, fazemos alarde pelo bem que ela fez nesses anos de vida. Pela maneira de ser, pelo modo de agir, pelo coração generoso e por suas atitudes de tão grande dignidade.

Viveu fazendo o bem. E o fez porque soube se conquistar como gente. E quem se conquista como ser humano sabe se doar, consegue servir e conhece as necessidades do outro.

Nos vangloriamos! Porque ela sabia nos olhar, nos enxergar por dentro. Nas nossas tristezas era a primeira a chorar, em nossas alegrias, seu sorriso já iniciava nos olhos até alcançar os lábios.

Nos vangloriamos! Pela sua dedicação a todos nós. Amou-nos vinte e quatro horas do dia, todos os dias. Amou-nos desde a fecundação da Aila até a última quarta feira.

Deus nos deu a graça da fé e pela bondade infinita do Pai nos deu a Enedina para que abraçássemos firmemente essa fé e vivenciássemos. Hoje estamos aqui na Igreja Una, Santa, Católica, Apostólica, porque fomos trazidos por ela. Foi ela quem nos iniciou no catecismo, nos ensinou os mandamentos e as primeiras orações.

Dirigimo-nos a Nossa Senhora, mãe de Deus: Maria, hoje a Senhora tem a seus pés outra Maria, a Maria Enedina. Gostaríamos de Lhe fazer algumas recomendações: ela gosta de carne “muçiça”, gosta de suco com bastante açúcar, não é muito de tomar água, sobremesa só doce de banana de rodelas.  Tem mania de limpeza e gosta das coisas bem limpinhas.

Maria, essa Maria tem muitas manias – a maior delas é nos amar intensamente. Amou-nos em profundamente. Amou-nos até quarta feira.

Até quarta feira?


Ora, quem nos amou de forma tão intensa até o ultimo suspiro, como pode parar de amar se onde ela está tudo é Amor?


terça-feira, 12 de maio de 2015

Será?

A
 vida se divide em três períodos: aquilo que foi, o que é e o que será.
Da mamãe, fico imaginando essas estações.
Qual a melhor?
O seu século dedicado a nós foi o melhor? Nada dela foi confiado a outrem, nada foi relaxado, nada desperdiçado nem esbanjado, toda sua vida foi para nosso colheita.
Será que é melhor do que agora?
Será?
Vendo-a cada dia, na sua cadeira, não tem preço. E sua presença é de um valor incalculável. Parece que sua existência justifica nossa presença ou a nossa presença que justifica sua vida?
Então, será essa a melhor época?
Será?
E quando ela partir e ficar face a face com o Pai? Lá onde o amanhecer é eterno e a visão é plena.
Será que pode existir algo superável?

Será?

terça-feira, 24 de março de 2015

Férias na 83!

E
ncontramo-nos todos os dias no tradicional "café da manhã", que nos permite colocar-nos em atitude de diálogo, de comunicação familiar, de experiências vividas e de reflexões partilhadas.

Juntos num clima fraternal.

Estou convicta de que só uma verdadeira experiência de encontro, muda a vida. Aqui, encontramos um ambiente onde verdadeiramente acolhemos e somos acolhidos, amamos e somos amados, valorizamos e somos valorizados, sem desconhecer que somos humanos, e entre humanos, são normais as tensões decorrentes do fato de vivermos juntos, que fazem parte de um processo natural, comum a todo grupo. Mas, como diz Lucinha: “acho que o que nos liga é tão forte que nada nem ninguém nos separa”. É mais um dom da dona Enedina, ela nos juntou, teceu uma rede entre nós tão bem feita e de tal maneira que não é possível romper.

Tenho consciência de que, tudo o que somos hoje, é fruto da formação que recebemos, embora com seus limites, nossos pais fizeram tudo que estava ao seu alcance. Valorizemos a base da nossa herança, de nos sentirmos protegidos, acolhidos, amados e, especialmente cuidados, numa amizade que não precisa muito esforço para termos determinadas atitudes, pois elas surgem em decorrência da nossa herança familiar.

Não poderia deixar de lembrar nossa ida a "SOLEDADE", com Arino, Arlene, Aglair e Anaires. Ambiente acolhedor, alegre, onde a floresta transpira, o ar puríssimo esfria e a gente tem de se agasalhar, recordando os dias idos e vividos intensamente no nosso tempo de infância. O silêncio e a paz contaminam o ambiente. Tudo convive numa harmonia universal.

Na volta a Fortaleza, continuamos colhendo delicadeza, liberdade, alegria. Um local de atenção, zelo e de envolvimento afetivo por parte de nosso irmão Airles. Tudo canta, tudo é graça!

Recordamos também um lanche oferecido pelo João Lino e Ana Catarina, que deixou marcas de ternura, afeto, delicadeza que é peculiaridade deles. Tenho certeza de que esse encontro teve como objetivo nos proporcionar momentos agradáveis, prazer de saborear um bom prato, uma boa bebida, gastar tempo conversando amenidades, com alguém cuja convivência nos faz bem.

Aderindo a mesma ideia, Ângela e Carlos, em tom de partilhar e fraternidade nos uniu com um farto jantar, que não faltou a espontaneidade e participação de cada membro. Antecipou assim, que a fraternidade não se espera que as coisas aconteçam espontaneamente, se deve buscar o que se quer construir: laços de amizade.

Quero perpetuar as emoções e fraternidade vividas naqueles dias, que com muita ternura as irmãs queridas Aila e Altair nos sabem propiciar. Convivências vividas em espírito de família, aqui me faço lembrar da Lucinha e do José Baptista, tão sensíveis ao afeto, à beleza da experiência de comunhão, aceitando e respeitando as diferenças.

São momentos que afastam as doenças psicossomáticas como: depressão, perda de sentido, sensação de vazio. Ser fraterno exige de cada um algum esforço continuado a fim de que se construa um ambiente caloroso e acolhedor, em que todos se sintam bem.

Enfim, agradeço nossa retaguarda tanto zelosa como amiga, me refiro a Augusta, a Célia e a Marta.

Uma feliz Semana Santa!


Aines Lino Bastos

segunda-feira, 2 de fevereiro de 2015

Dois, de dois, de quinze, cento e cinco anos

U
ma mulher de pouco estudo em sala de aula. Uma letra belíssima, quase que desenhada.

Pouco sabia escrever, mas muito sabia ler.

Sabia ler nossas alegrias e tristezas. Nossas emoções e sentimentos.

Sabia ler nossa vida.

Nossas lágrimas, nossas preocupações, lia no nosso rosto.

O que estava ocorrendo com a gente, lia na nossa maneira de agir.

Se uma lágrima brilhava em nossos olhos, grossas lágrimas lhe corriam ao longo de suas faces.

Se esboçávamos um riso, nos dois cantos da boca lhe nascia um sorriso.

Era assim. Por nós, dava a vida. Deu-se por nós.

O que hoje por ela fazemos é tão pouco, quase nada. Quanto mais nos envolvemos com ela, mais nos desenvolvemos como filho, como irmão e como gente. Parece que ela assim como está, tão velhinha, tão quietinha, não tem mais nada a nos dar.

Ledo engano.

Ir lá, na 83, vê-la, senti-la e tocá-la nos fortalece. E a fortalecemos. Esse encontro nutre nossa essência. Damos-lhe vida. Em nossas idas, digamos assim, mais caseiras, nas nossas visitas mais simples, o ver, o sentir e o tocar são tão necessários para sua vida como o óleo que lubrifica a máquina e a faz funcionar.  

É como existisse uma força que nos atraísse, que nos prendesse e nos dominasse. É impossível não estar com ela. A essa força podemos dar o nome de amor. Amor, sim, amor, ela é amor.

Sua vida foi amor, seu cuidar da gente foi amor. Todo amor é livre e toda ação livre tem dois momentos: primeiro é preciso que se queira, depois é necessário que se faça. Por amor, ela queria e fazia.

Poderia dar exemplos, inúmeros, cito pouquíssimos.

Cedo, café já pronto, levantava-se para abrir as portas e janelas; vinha o sol, que parecia esperar esse momento, para inundar nossa casa, nossa vida, com sua onda de luz.

À noite, partilhava o terço com todos nós, alertando àquele que se retardava nas respostas. No final, ajoelhava-se diante da imagem da Virgem, enquanto já dormíamos, concluía suas orações, fazendo o sinal da cruz e abençoando todos nós.

Nas madrugadas de chuvas e goteiras, visitava nossas redes, cobria-nos com lençóis e carinhos. Por amor, ela queria e fazia.

Dois, de dois, de quinze, cento e cinco anos.

Nesses dias, não estar com ela é privar-se de um momento de contemplação, é abster-se da carícia de tocar seu meigo corpo, é renunciar o amor gratuito, quase que divino.

Nesses dias, estar com ela é descobrir numa ação o agradecimento de sua doação. É perceber que o seu “deu-se por nós” é retribuído, no tempo devido, por aquilo que nos foi ensinado em vida, com palavra e ação. Pois o verdadeiro amor é assim, vai amadurecendo e fortificando com o tempo, tornando-se um amor mais livre e gratuito.

É pela luz que nossa casa se ilumina, é pelo carinho em nossas redes que nosso ser se faz maior, é pelo terço da noite que nossa alma engrandece, assim também, é “pelo amor que a fé se faz ativa”.

Deu-se pelo amor e pela fé ativa.


Parabéns para ela pelo que ela é e parabéns para nós pelo que somos... dela.


Um dia diferente!

Um dia diferente!

Poderia ter sido apenas um encontro que se eternizaria numa foto amadora.

Poderia ter sido apenas momentos agradáveis que se perdiam em lembranças.

Poderia ainda ter sido um gesto delicado que acabaria em si mesmo.

Mas foi muito mais.

Foi diferente... muito diferente... desde o começo...

Desde o momento em que encaixotando as mágoas e divergências, dissemos SIM para a vida.

SIM para a graça!

Diferente quando sentimos a vontade de mudar, de recomeçar, de esquecer as diferenças, de jogar fora o que separava.

Diferente quando pela estrada nos desfizemos do que pesava, do que desequilibrava, do que dividia.

Diferente quando recolhemos o húmus que fertiliza e dá esperança.

Diferente porque um encontro de almas, mentes e corações... um encontro de verdadeiros irmãos.

Diferente porque trocamos o intelecto pela compaixão, porque descobrimos que a vida é breve, não suporta adiamentos e exige força fé e alegria, que só os de boa vontade conseguem ver e viver... é o início do Reino.

Porque as mágoas devem ser como gotas numa folha, enverga, rola e vai embora sendeiras marca da passagem.

Diferente por nos fazer entender que o orgulho, a briga, a distância, o silêncio, não são capazes de recolher a mão estendida, o sorriso amigo e o abraço apertado.

Diferente porque voltamos livres, leves, alegres, com vontade de eternizar, de voltar, de saber que nossos pais fizeram um ótimo trabalho, divino e a certeza que estão sempre por perto, velando por nós e para não termos dúvida escolheram o melhor lugar, o lugar onde tudo começou:

a SOLEDADE.

Abraços em todos!


Ana Lúcia de Oliveira


Te amo agora e para sempre...

N
ão preciso... mas gostaria...

Não preciso estar perto, para dizer que te amo...

Não preciso chorar, para falar da saudade...

Não preciso te expor, para gritar o meu orgulho de ti...

Não preciso te ver, para saber de cada detalhe do teu rosto...

Não preciso te lembrar, porque vives dentro de mim...

Não preciso estar junto, porque sou consequência de ti...

Não preciso estar ao teu lado, para sentir o teu amor e tua força...

Não preciso falar contigo, porque já sabes o que não disse...

Não preciso estar aí agora, mas gostaria...e este seria o meu maior desejo...

Te amo agora e para sempre...


Ana Lucia Oliveira



quarta-feira, 14 de janeiro de 2015

Hoje, falo de sua alma, de seu coração



Muito falei dela.

Falei dos seus cabelos. Referi-me às suas mãos. Dos seus pés me declarei.

Hoje, falo de sua alma, de seu coração.

E vou começar do começo.

Quando ela nasceu, creiam-me, alguém profetizou: “Viva e viva por muito tempo. A menina vai ser útil aos outros”.

Assim foi.

Em seu coração – assim como nas asas de uma rolinha e na bênção de Nossa Senhora – sempre tinha espaço para todos, e é por este espaço que se percebe e goza a doce alegria de fazer o bem. Espaço que não recrimina, recinto que não cria mágoa, lugar que perdoa, anistia e absolve. Esta foi sua escolha, este é o desígnio de Deus para ela – e para nós -, esta é a sua vida.

Para esta admirável alma, perdoar era um gozo ilimitado, parecia achar uma fascinação muito especial no ato de perdoar. Tratava-se para ela apenas, creio eu, de uma ventura banal o que para nós, algumas vezes, está acima de nossas forças e muito abaixo de nosso ego.

Não é difícil recordar que no meio de grandes dificuldades, angústias e atropelos ela soube conservar um coração crente, magnânimo e simples. “E dessa gente sabe-se que Deus não se esconde”, pois lhe é buscado com um coração sincero.

Vê-la no oitão, ajoelhada e rezando, é uma imagem dessa mãe encantadora que tão graciosamente se dirigia a Deus que na minha alma ficou como uma das visões mais belas e mais indeléveis da minha vida.

Falando para ela de nossas dificuldades, ouvia-nos, bebendo-nos as palavras e, nalgumas vezes, com os olhos cheios de lágrimas, oferecia-nos o colo, simplesmente o colo. A esse colo, sem exagero, devemos dar o nome de amor.

Agora, aos cento e cinco anos, podemos todos dizer: és uma criança, mas és melhor de todos nós, minha boa, minha querida mãe.

Marcas do seu caminhar. Sinais do nosso caminho.




Marcas do seu caminhar. Sinais do nosso caminho.
Pés que iam sempre mais além, na cata do novo, na busca da beleza
que o Pai estende além de suas fronteiras.
E nessas passadas mostrava-nos os sinais de luta e esperança.

Pés que caminhavam ao nosso lado, às vezes.
 Noutras, antes de nós. Quase sempre, à nossa frente. Às vezes,
era sentirmos sua presença, seu apoio, o cheiro da compaixão.

Noutras, quando alguém se retardava e ficava, era a hora do apoio, do ombro e do colo.
Quase sempre, estava a nos indicar o verdadeiro caminho,
nem sempre o mais fácil, certamente o melhor.

Marcas do seu caminhar. Sinais do nosso caminho.

Pés que nunca nos deixava caminhar sozinho, ou melhor dizendo,
 nunca nos deixava caminhar solitário.
O caminhar juntos é um gesto de sair de si mesmo.

Pés de mais de um século que seguiu sempre um caminho de abertura a Deus.

Beijá-los, mais do que um gesto de humildade
é um sinal de reconhecimento de sermos pequenos diante daquela
que sempre esteve atrás de nós, ao nosso lado e, principalmente, à nossa frente.

Beijemo-los!



NATAL – JOSEFINAS - 2014

A irmã Socorro Beleza pediu-me que dissesse algumas palavras recordando o ano que passou. Lógico que ela se referia ao Ano Litúrgico.

E, assim como no ano passado, nós estamos no período do Advento nos preparando para o Natal. Depois vem as oitavas de Natal, em seguida o Tempo Comum, chega Quaresma onde a gente se prepara para a Semana Santa. Depois Pentecostes, Tempo Comum e chegamos ao Advento mais uma vez.

Se usarmos a imagem de uma montanha, poderemos dizer que o ano litúrgico nos convida sempre novamente a subi-la como que em espiral. De ano em ano passamos pelas mesmas paisagens, mas a cada vez a celebração dos mistérios nos atinge de modo diferente, ou deveria nos atingir de forma distinta, devido à nossa realidade sempre inédita, nova, incomum. Isso depende da intensidade de nossa participação e de nossa abertura ao mistério.

O certo é que nós fazemos isso ano após ano, fazemos essa subida em espiral e nessa caminhada cumprimos todos os preceitos, participamos de todas as celebrações, fazemos novenas, vamos à missa. No entanto, corremos o risco de não mudarmos o nosso modo de ser, a nossa maneira de agir, o nosso comprometimento.

O ano litúrgico parece não mexer com a gente. Se o ano Litúrgico não mexe nem remexe com nosso dia-a-dia, essa nossa caminhada está sendo vazia, sem criatividade e sem paixão. Apenas a cumprimos embora de maneira rotineira. Repito, apenas a cumprimos, mas o nosso modo de agir, o nosso comportamento não muda. O ano Litúrgico parece não nos dizer nada, não nos toca, parece ser outra coisa. É como se fossem duas coisas distintas: nossa vida eclesial e nossa vida na sociedade.

O papa Francisco nos alerta quando diz que “se, através de Jesus, Deus se comprometeu com o homem a ponto de se tornar como um de nós, quer dizer que tudo o que fizermos a um irmão ou a uma irmã, a Ele o fazemos. Foi o próprio Jesus quem no-lo recordou: quem alimenta, acolhe, visita e ama um destes mais pequeninos e mais pobres entre os homens, ao Filho de Deus que o faz”.

Adicione às palavras do papa Francisco as palavras de João Batista, as quais sempre de novo ouvimos a cada Advento: “No meio de vós está ALGUÉM que não conheceis”.
Isso acontece porque, talvez, a gente não saiba aonde procurar. E onde encontra-Lo. É lá nas pessoas simples e humildes que devemos encontrá-LO. Pois são elas que têm testemunhos de amor. Como vai dizer Pagola: “São pessoas entranhavelmente boas”.

Essa gente pelas quais passamos e muitas vezes nem consideramos gente. Essa gente não é a Palavra de Deus, mas essa gente é a voz que nos convida a fazer o verdadeiro ano litúrgico. Essa gente não é a Luz, ninguém é a Luz, só Ele é a Luz, essa gente não é a Luz, mas irradia a Luz no seu caminhar, no seu testemunho, no seu sofrer.

Então, essa caminhada que fazemos em espiral, todos os anos, e que não mexe com a gente, deve remexer com nosso modo de agir. Talvez nossa caminhada tenha muita devoção e pouca fé. Fazemos novenas, terço dos homens, rezam-se mil Ave Maria, adorações. Tudo mais e tudo bem. Mas quem alimentastes, quem acolhestes, quem visitastes e quem amastes?

Enfim, parece ser mais fácil e cômodo praticar minha devoção do que vivenciar minha fé. E quando alguma vez vamos em busca do preso, do nu ou do faminto, principalmente agora nessa época do ano, quando levamos um prato de sopa à Praça do Ferreira, sempre o fazemos como se fôssemos melhor, superior a eles. Não conversamos com eles, não falamos de igual para igual, e, certamente, a verdadeira confraternização natalina somente pode acontecer entre iguais. E, por ventura, se alguém fosse maior, não tenhamos dúvidas, seriam eles.

Assim, nas palavras do profeta, a gente só percebe que começa a conhece-Lo quando Ele cresce e a gente diminui.

Então, somos convidados sempre de novo a subir a montanha, pois este caminho nunca está concluído. Como na vida de cada um de nós há sempre a necessidade de voltar a partir, de se erguer, de reencontrar o sentido dos passos de Jesus, de sua caminhada. Peçamos como salmista: “Fazei-me conhecer a vossa estrada, ó Senhor”.


Um natal cheio de paz e sabedoria para todos e todas da comunidade da, digamos assim, comunidade da Irmã Socorro Beleza.